Da edição impressa da Folha 2 (Folha da Manhã) de hoje é aqui no Blog Opiniões.
Todas as vertentes da cultura são
atendidas em Campos? “É mentira!”
Como alguém que dedicou à militância nas artes os 43 últimos anos, dos 58 que tem de vida, com a bagagem dois FestCampos vencidos como poeta e mais de 100 peças montadas, inclusive no Rio de Janeiro, como diretor teatral, pode estar hoje desempregado e há um ano sem encenar nada numa cidade de orçamento bilionário e governada por um grupo político egresso do teatro? Na imitação tragicômica entre a arte e a vida, talvez nenhum caso pessoal encarne melhor o atual cenário da cultura de Campos do que o de Antonio Roberto de Góes Cavalcanti, o Kapi. Presente a todas as manifestações organizadas pelos artistas locais em protesto contra a denúncia de censura a “Bonitinha, mas ordinária”, de Nelson Rodrigues, no Trianon (relembre o caso aqui e aqui), ele foi também o primeiro a encenar uma peça no teatro hoje referência de Campos, quando este ainda estava só no esqueleto, em 1995, com “Gota d’água”, adaptação de Chico Buarque e Paulo Pontes da tragédia grega “Medeia”, de Eurípedes (480 a.C/ 406 a.C.). Ecoando quem inventou o teatro, a democracia e uma tal civilização ocidental, Kapi respondeu à presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), a quem foram concedidos plenos poderes sobre a cultura pública de Campos. Se ela afirmou em entrevista que “todas as vertentes da cultura do município têm sido atendidas”, o diretor de teatro e poeta goitacá foi lacônico: “É mentira!”
Folha Dois – Você participou de todas as manifestações dos artistas de Campos, desde a denúncia de censura à peça “Bonitinha, mas ordinária”, de Nelson Rodrigues, no Trianon, por supostos motivos religiosos da prefeita Rosinha. Até agora, qual é o saldo?
Antonio Roberto Kapi - Apesar de muito blá-blá-blá e do individualismo da natureza ególatra do artista campista, como bem disse Soffiati (aqui), acho que o saldo é positivo, principalmente pelo debate suscitado através do face e das entrevistas dadas por artistas e intelectuais à Folha da Manhã. Por inúmeras vezes tentei unir os diversos segmentos da classe artística para lutar em prol do bem comum, mas sempre me deparei com barreiras e suspeitas de que eu estava liderando movimentos em benefício próprio. Espero que desta feita o movimento sem lideranças vingue e seja vitorioso em suas reivindicações.
Folha – O professor e escritor Arthur Soffiati afirmou em entrevista que a discussão sobre a cultura de Campos importa mais do que aquilo que a gerou. Concorda? Por quê?
Kapi - Claro que sim. Essa política cultural (?) que vigora no município há muito, é uma política equivocada, calcada no princípio romano da política do “pão e circo”, que leva diversão para o povo, não cultura e não contribui em nada para a formação e o crescimento do ser humano que aqui vive. Não que a população não tenha direito à diversão, mas cultura é bem diferente de lazer e a indústria cultural de massa tem meios eficazes de se perpetuar, não depende de verbas públicas, a não ser quando serve a outros propósitos. Acho que a censura a “Bonitinha, mas ordinária”, do genial Nelson Rodrigues, foi providencial ao mostrar a cara da pobreza cultural e da incompetência dos gestores desta política. Foi o detonador de um processo de indignação da classe artística.
Folha – Sobretudo após a entrevista de Soffiati, que embora não tenha sido o único, foi quem mais abertamente criticou também os artistas locais, alguns destes acusaram o golpe, chegando a questionar o próprio debate. Como alguém que milita no meio há mais de 40 anos, há como se pretender fazer cultura sem debatê-la?
Kapi - Há que se considerar o fato de que toda a classe é composta de diversos indivíduos, inclusive a artística, com os mais diversos níveis de formação e talento. Cada um reflete no seu processo de criação o que absorve do mundo. Esse embate depende basicamente de sua capacidade intelectual e deságua no exercício dialético do debate. Muitas vezes sem nem mesmo entendê-lo.
Folha – Essa reação negativa de alguns artistas teria sido apenas vaidade ferida por quem se viu criticado numa discussão da qual talvez se julgasse dono, ou poderia ser algo mais, como as dificuldades que a continuidade do debate podem ter gerado em projetos pessoais junto à FCJOL?
Kapi - A classe artística local é bem diversa. O único elo comum é a vaidade. Não creio em artista modesto. E essa vaidade muitas vezes faz com que o artista não meça esforços para dar vazão ao seu exibicionismo. Só que não tem como ser “Arlequim, servidor de dois amos”. Ou você serve à causa ou aos seus interesses pessoais.
Folha – A partir da denúncia de censura de Nelson, o poeta Artur Gomes propôs (aqui) encenar em protesto “O pagador de promessas”, de Dias Gomes, nos jardins do Trianon. Depois, Soffiati propôs a formulação coletiva de uma notícia-crime ao Ministério Público para se investigar o suposto superfaturamento dos shows. E, sobre uma proposta e outra, nenhum artista sequer se pronunciou. Falta coragem?
Kapi - Acho que a remontagem do “O pagador de promessas”, de Dias Gomes, ironias à parte, bem pertinente, até porque protestar pela arte fazendo arte tem tudo a ver. Estamos juntos, Artur, pode contar comigo. Quanto à proposta de Soffiati, acho que “…não é que falte coragem, tá sobrando medo…”. Ninguém tá afim de dar a cara a tapa. Mesmo porque, falemos a verdade: se o Ministério Público de Campos quisesse de fato, já teria feito alguma coisa.
Folha – Também professor e escritor, Adriano Moura ressalvou (aqui) que “o artista não é apenas uma vítima no meio disso tudo”. Soffiati foi além ao afirmar: “Ele (o artista de Campos) está no poder não para atender ao público, mas para realizar suas ambições pessoais e para ter uma fonte de renda”. Via de regra, é isso mesmo?
Kapi - Como diz meu amigo Murilo Dieguez: “É cada um por si e Deus contra”. Mas se houvesse uma política cultural justa o artista se daria ao respeito. Pois respeito não se vende, não se impõe, se dá. Mas tentando sobreviver de sua arte, só se entregando ao que chamamos no teatro de caça níqueis.
Folha – Não só Adriano, Soffiati e Artur (aqui), mas também os professores Deneval de Azevedo Filho (aqui) e Cristina Lima (aqui), além do diretor de teatro José Sisneiro (aqui), foram unânimes em confirmar a existência da cultura do pires na mão, entre os artistas locais, em relação ao poder público. Acha que ela interessa mais a quem se acomoda em ser pedinte ou a quem escolhe se atende ou não? Há como mudar? Interessa mudar?
Kapi - Antes do advento do garotismo sempre se produziu cultura em Campos, em todos os segmentos. Cheguei a ganhar dinheiro fazendo teatro. À época, o único espetáculo que dirigi produzido pelo poder público municipal foi “Arena contra Zumbi”, de Gianfrancesco Guarnieri, em 1988, quando da inauguração do Parque Alberto Sampaio, no governo de Zezé Barbosa, quando a cultura do município era vinculada a um departamento e comandada pela professora Diva Abreu Barbosa. Depois começou a ser implementada uma política cultural (?) calcada em eventos, pura e simplesmente. Houve um tempo em que tínhamos oportunidade de assistir aos consertos do “Projeto Aquarius”, em que a folclorista Ana Augusta Rodrigues capitaneava a cultura popular e nos induzia a respeitá-la e valorizá-la. Hoje temos o Milton Cunha a ditar regras, sabe-se lá a que preço, sobre nossas manifestações culturais mais genuínas. Vivemos num tempo que em muito nos faz lembrar o filme “Mephisto”, de István Szabó. Se há como mudar? Claro que há. Depende de vontade política. Afinal, o Fundo Municipal de Cultura foi criado pra quê? Com dotação orçamentária e editais que contemplem os diversos segmentos, é a forma mais democrática e justa de se implementar uma política cultural no município. Essa história de se criar demandas é pura balela, embromação. Tentando contribuir para a efetiva implantação do fundo, consultei um tributarista, que me esclareceu sobre a inconstitucionalidade de se atrelar a dotação ao IPTU e ao ISS. Mas com relação aos royalties não há impedimento legal, o que falta é vontade política. Mas a municipalidade vetou, por achar elevado, o percentual de 0,1% proposto por Vilmar Rangel ao elaborar a minuta do projeto de lei de criação do Fundo. O que daria algo em torno de R$ 500 mil ao ano. Só o cachê da Bethânia foi em torno da metade deste valor. E eles acham este valor elevado? Faz-me rir!
Folha – Você trabalhou no primeiro governo de Anthony Matheus, além das administrações Sérgio Mendes, Arnaldo Vianna e Alexandre Mocaiber. Que diferenças observou não só entre cada uma delas, como também naquilo que viu de fora nas gestões Rosinha, integrando o processo que Deneval chamou de “garotização” e julgou “péssimo” à cultura de Campos? Soffiati está certo ao considerar essa política cultural ao longo de 24 anos como “populista” e “autoritária”? Por quê?
Kapi - Em 1989, tudo era novidade. Minha geração chegara ao poder e entendíamos que a máxima teatral, “O espetáculo não pode parar”, deveria ser o lema de nossa ação. Trabalhávamos muito, até que fizemos com que ele (Anthony) fosse considerado um grande administrador. Mas depois dos dois primeiros anos, a máscara começou a cair. Já no governo de Sérgio podemos implementar uma política de cultura e de turismo verticalizada. Chegamos a trazer uma faculdade de turismo para Campos. Do segundo governo de Garotinho, me neguei a participar. Quando Arnaldo assumiu passamos a viver uma fase de efervescência cultural, tanto no que tange à política cultural quanto à política de eventos em si, no que pese a forma de fomento implementada. Já no governo Mocaiber, tivemos a excelente atuação de Luciana Portinho à frente da cultura, que muito incentivou o artista local. Todas tiveram seus equívocos, erros e acertos. Mas nada supera o retrocesso, o populismo e a exclusão da política cultural (?) atual, que embora eu tenha em seu estafe pessoas do quilate de Orávio, de João Vicente, de Leninha, concentra todo poder e a caneta nas mãos de quem nem sabe quem é Nelson Rodrigues.
Folha – Leu a entrevista feita com a presidente da FCJOL no site Campos 24 Horas (aqui), sobre as críticas que a política pública da cultura do município vem sofrendo? Entre outras coisas, ela afirmou que todas as vertentes da cultura de Campos têm sido atendidas. Concorda?
Kapi - É mentira! Somente uns poucos privilegiados têm acesso às benesses do poder. Com exceção das bandas de axé, de pagode e similares e algumas instituições que botaram a boca no trombone, todos estão à míngua, tentando fazer das tripas coração para exercer o seu mister.
Folha – A presidente da FCJOL também defendeu na entrevista a centralização de toda política pública da cultura de Campos em suas mãos, feita a partir da última reforma administrativa de Rosinha, num movimento criticado publicamente por Artur, Adriano, Deneval, Soffiati, Cristina e Sisneiro. Você, o que achou?
Kapi - Essa reforma administrativa foi um verdadeiro retrocesso. Não tem explicação lógica que a justifique. Quem é Patricia, no que tange à cultura? Qual a sua experiência enquanto gestora? Quem é ela face a Orávio e João Vicente? Com essa defesa, ela demonstra claramente porque está ocupando o cargo que ocupa. “Só se conhece verdadeiramente um homem quando ele detém o poder e legisla as leis”, como asseverou Sófocles, em “Antígona”.
Folha – Ausente na entrevista foi a pergunta sobre as denúncias de favorecimento nas contratações pela FCJOL da banda A Massa, cujo percursionista é marido da presidente da mesma FCJOL. Mas o fato é que também nenhum artista tocou no assunto, nem na reunião com a presidente, em 17 de julho, nem na Conferência Municipal de Cultura, três dias depois, ambas com a sua presença. O assunto é tabu?
Kapi - Não acompanho de perto as contratações da Fundação. Tudo que sei é através do face e considero esse um nepotismo deslavado. Consta que a denúncia contra Patrícia Cordeiro e seu marido, por improbidade administrativa, já está feita no Ministério Público. Cabe, portanto, à prefeita e/ou ao Ministério Público abrir uma investigação para apurar os fatos e cumprir a devidas sanções. Se é tabu, temos que reivindicar que este seja quebrado.
Folha – Por falar na Conferência de Cultura, você perdeu a eleição de delegado para representar Campos na Conferência do Estado, em meio a vários indícios de irregularidade e manipulação no pleito, apontados (aqui) pela estilista Lívia Amorim. Por que essas denúncias não foram até hoje formalizadas à secretaria estadual e ao ministério da Cultura? É assunto posto? Sua eleição mudaria alguma coisa?
Kapi - Na realidade, eu estou eleito sim. Segundo Orávio, alguns participantes não oficializaram suas inscrições, o que levou a diminuir o número de representantes de três para dois, já que este deveria ser proporcional ao número de representantes da sociedade civil na conferência. Como ele correu atrás das pessoas para que estas se inscrevessem após o término da Conferência, a proporcionalidade passou de dois para três representantes. Afinal, eu já fui representante eleito da sociedade civil pela região Norte Fluminense no Conselho Estadual de Cultura. Devo ter alguma importância neste contexto.
Folha – Você é um dos principais defensores da implementação do Fundo Municipal de Cultura, aprovado desde o fim do governo Mocaiber e empurrado com a barriga nos cinco anos seguintes de governo Rosinha. Por que ele seria tão importante e como fazer para que finalmente se torne realidade?
Kapi - Como já disse, essa história de nós artistas criarmos demandas é pura balela. Acho lastimável que um governo cuja origem está nos palcos trate a cultura com tanto menosprezo. Esperava mais de Orávio, um intelectual e agente cultural com um histórico invejável. Acho que ele comete alguns acertos quando o deixam trabalhar, mas com a experiência e o currículo que tem, vê-lo jogando o jogo dos contentes é deplorável. Se a política municipal de cultura estiver alicerçada no Fundo e gerenciada pelo Conselho, acredito que teremos uma política cultural de fato. Acho que só conseguiremos isso deixando as vaidades e os interesses pessoais de lado e nos unindo para pressionar o Legislativo a abraçar a nossa causa. Com certeza, quem abraçá-la estará bem na fita com a classe artística.
Folha – Deneval e Soffiati lembraram a necessidade de interação entre os agentes culturais e as universidades do município, muitas vezes isolados em seus saberes. Entre 1994 e 2005, você dirigiu o departamento de cultura da Faculdade de Odontologia de Campos (FOC) e há pouco concluiu uma bolsa na Uenf. Qual a importância desse diálogo e como ele poderia evoluir no município?
Kapi - Sou do tempo em que a educação formal se baseava em preceitos humanistas, o que muito contribuiu para a formação do cidadão que hoje sou. Quando Lusitano me convidou para atuar na FOC como diretor teatral, vislumbrei a possibilidade de implantar uma coordenação cultural que pudesse incutir nos alunos uma consciência humanística que os levassem a uma consciência critica de seu papel social enquanto profissionais. Deu super-certo. Implantamos oficinas de teatro, canto coral, artes plásticas, buscando uma interação escola/comunidade que começou com a montagem de “Os órfãos de Jânio”, de Millôr Fernandes e culminou com a montagem de “O Romanceiro da Inconfidência”, de Cecília Meirelles, que envolveu 100 pessoas em cena, entre alunos da FOC, da FDC e integrantes da comunidade do Matadouro. Já na Uenf, a visão tecnicista da educação dificultou um pouco a implementação de uma leitura humanista da formação acadêmica. Somente através da arte o ser humano é capaz de depurar sua sensibilidade. Não que todo mundo deva ser artista, mas a depuração da sensibilidade possibilita uma leitura mais humana do mundo.
Folha – Em seus tempos na FOC, você foi o primeiro a montar uma peça no Trianon, em 1995, ainda com o teatro só no esqueleto, sem teto. Como foi aquela encenação de “Gota d’Água”, adaptação de Chico Buarque e Paulo Pontes da tragédia grega “Medeia”, de Eurípedes? Cristina Lima disse sentir falta dos artistas de Campos no Trianon. E você?
Kapi - À época, embora integrasse o governo Sérgio Mendes, resolvi montar “Gota d’água” no Trianon no osso, como forma de protestar contra a morosidade da obra, além de provar que os artistas de Campos tinham condições e talento para ocupar aquele espaço. Na minha concepção o palco do Trianon estava para nós, artistas, assim como a casa própria para os operários. Após cada apresentação, fazíamos questão de ressaltar a importância da obra para a arte campista. No Festival de Teatro Universitário daquele ano, ganhamos todos os prêmios e Angela Bastos, então colunista social da Folha, passou a se referir a mim como “o mestre Kapi” no jornal. Mas não foi somente “Gota d’água” que montei no Trianon. “Terror e miséria no III Reich”, de Bertolt Brecht; “Sons do Planeta Blue”, de Beth Rocha; “O pássaro azul”, de Maeterlinck; “Os dragões não conhecem o paraíso”, de Caio Fernando Abreu; e “O Bruxo do Cosme Velho”, de Luciana Tavares, fazem parte do meu currículo naquela casa de espetáculos. Infelizmente o Trianon se transformou no grande detonador da produção cultural da cidade, com uma programação que em geral apresenta humoristas globais de qualidade duvidosa, do Zorra Total, um dos piores programas de humor da TV aberta brasileira. Quando não, é cedido para reuniões do estafe municipal, em pajelanças generalizadas, ou congressos e afins. O seu espaço deveria ser destinado exclusivamente para as arte.
Folha - Ironicamente, a última peça que você dirigiu, há um ano, no Sesc, foi justamente “Nelson Rodrigues, o anjo pornográfico”. Na condição de quem mergulhou na vida e na obra do maior dramaturgo brasileiro, para reunir ambos no palco, como viu a denúncia da sua censura em Campos e a repercussão do caso em mídia nacional (aquie aqui)?
Kapi - A sede de poder faz com que às vezes vassalos queiram ser mais realistas que o próprio rei. Não acredito que a iniciativa tenha partido diretamente de Rosinha. Muito menos de Orávio ou de João Vicente. Assim como não acredito nas desculpas esfarrapadas apresentadas para justificar o injustificável. Existe todo um estafe no Trianon capacitado para orientar os grupos e companhias que lá pretendem se apresentar. Se isso não ocorreu, alguém falhou e com certeza não foi o pessoal do grupo “Oito de Paus” (que denunciou a censura). Eu mesmo passei por uma situação no mínimo delicada, quando pretendi montar “Vestido de Noiva”, de Nelson. Quando souberam que eu estava ensaiando a peça, a então Fundação Teatro Municipal Trianon me solicitou o projeto, porque entendiam que o centenário de Nelson não poderia passar em branco. Apresentei o projeto e valores que seriam divididos com o Sesc. Fiquei aguardando até 15 dias antes da estréia prevista, com o contrato com o Sesc já assinado. Como não se dignaram a me dar uma satisfação, me vi obrigado a criar um texto, “Nelson Rodrigues, o anjo pornográfico”, para não descumprir o contrato com o Sesc e, além de não receber, ter que pagar a multa devida por quebra de contrato. É uma falta de respeito total, ao teatro, aos artistas, à memória de Nelson. Acho que o Sated (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões) deveria se pronunciar emitindo uma nota de repúdio a esta situação.
Folha – Sobre sua direção de “Meu querido diário”, peça de Adriano interpretada por Yve Carvalho, no Teatro de Bolso, em 2009, a matéria da Folha Dois à época já alertava ao “ostracismo a que pretenderam relegá-lo os podres poderes da planície”. Como alguém com mais de 100 peças encenadas, inclusive no Rio de Janeiro, pode estar hoje desempregado e já há um ano sem montar nada numa cidade governada por um grupo político egresso do teatro? Seu caso resume o da cultura de Campos? E fere?
Kapi - Já estou acostumado com as adversidades. Nasci após três tentativas de aborto, de uma mãe tuberculosa. Há 16 anos adoeci, entrei em coma e sobrevivi sem seqüelas. Em 2009, após ficar desempregado, por apoiar a candidatura de Arnaldo à prefeitura, entrei num processo depressivo que resultou numa tuberculose, que levei três anos pra curar. Herdei de minha mãe a perseverança e sou bom de briga, no sentido figurado. Mas no momento, estou ensaiando “Zoo Story” , “A história do zoológico”, de Edward Albee, com Yve Carvalho e Luis Fernando Sardinha, sem apoio nenhum do poder público. Estamos tentando sensibilizar a iniciativa privada para podermos viabilizar o projeto. Afinal, vaso ruim não quebra, vira craquelê.
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