sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Mais Bandeira


Testamento

Manuel Bandeira

O que não tenho e desejo

É que melhor me enriquece.

Tive uns dinheiros — perdi-os...

Tive amores — esqueci-os.

Mas no maior desespero

Rezei: ganhei essa prece.

Vi terras da minha terra.

Por outras terras andei.

Mas o que ficou marcado

No meu olhar fatigado,

Foram terras que inventei.

Gosto muito de crianças:
Não tive um filho de meu.

Um filho!...

Não foi de jeito...

Mas trago dentro do peito

Meu filho que não nasceu.
Criou-me, desde eu menino

Para arquiteto meu pai.

Foi-se-me um dia a saúde...

Fiz-me arquiteto?

Não pude!

Sou poeta menor, perdoai!

Não faço versos de guerra.

Não faço porque não sei.

Mas num torpedo-suicida

Darei de bom grado a vida

Na luta em que não lutei!


(29 de janeiro de 1943)

Poesia extraída do livro "Antologia Poética - Manuel Bandeira", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 2001, pág. 126.

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