O Museu Histórico de Campos serve “à realização de eventos
espaçados e exposições políticas que inflam o ego da presidente” da
Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL), Patricia Cordeiro.
Essa agenda seria ditada com “muitos gritos e, quando há contrariedade,
ameaçam”. O Arquivo Público Municipal “está em estado vegetativo”. O
Museu Olavo de Carvalho “está fechado e a FCJOL fala em reforma”. A
Biblioteca Municipal Nilo Peçanha, embora “entupida de ótimas ideias”,
“não recebe investimentos”. E o Centro de Eventos Populares Osório
Peixoto (Cepop), erguido ao custo de R$ 100 milhões dos cofres públicos
municipais, está “entregue a feiras de automóveis”, usado apenas
eventualmente para um “carnaval feio, onde escolas de samba do Rio
cobram cachês ilógicos”. Se vista de fora a condução da cultura de
Campos, centralizada pela prefeita Rosinha (PR) na FCJOL, já vinha sendo
alvo de muitas críticas, como as que fizeram Artur Gomes (aqui), Adriano Moura (aqui), Deneval de Azevedo Filho (aqui), Arthur Soffiati (aqui), Cristina Lima (aqui), José Sisneiro (aqui), Antonio Roberto Kapi (aqui), Ricardo André Vasconcelos (aqui) e, mais recentemente, o petista Makhoul Moussallem (aqui) e vereador Rafael Diniz (aqui),
também quem viu de dentro como as coisas funcionam, ou parecem não
funcionar, guardou péssimas impressões. Gaúcho radicado na planície
goitacá desde 2009, o escritor e historiógrafo Cristiano Pluhar
trabalhou no Arquivo Público, onde publicou dois livros sobre a história
do município, e ajudou a fundar o Museu de Campos, até ser desligado
sem maiores explicações, em 2012, após ter feito um comentário
considerado “deselegante”, nas redes sociais, à atuação de Patricia
Cordeiro na presidência da FCJOL.
Folha Dois – Seu testemunho (aqui)
sobre como funciona, ou não funciona, a estrutura municipal de cultura,
causou impacto nas redes sociais. Por que resolveu trazer a público
essas questões internas?
Cristiano Pluhar - Desde novembro de 2012, me
afastei das atividades que desenvolvia no Museu Histórico de Campos dos
Goytacazes. O posicionamento crítico se iniciou nesse período. Quem
acompanha minha lida no site “Histórias dos Campos” ou a coluna
“Histórias dos Campos dos Goytacazes”, no jornal virtual O Campista, comprova o fato, nada oportunista.
Folha – Logo no início do seu texto, você cita os
questionamentos feitos na imprensa à cultura do município. Encontrou
neles o meio propício para externar também suas críticas?
Cristiano - Como mencionei: não se trata de
aproveitar de uma situação. A expansão do pensamento ocorreu,
simplesmente, por interesse da sociedade cultural campista e também da
mídia local.
Folha – Sinceramente, daria publicidade aos seus
questionamentos sobre a estrutura pública da cultura municipal se não
tivesse sido dela desligado? Como foram as circunstâncias da sua saída?
Ela se deu mesmo por conta de um comentário no Facebook?
Cristiano - É clichê óbvio afirmar que “mamei na
teta” do governo. A sociedade desconhece minha história nos Campos dos
Goytacazes. Em abril de 2007, em uma comunidade do escritor Charles
Bukowski, no “falecido” Orkut, conheci minha atual esposa. No mês de
julho do ano seguinte passei três semanas na cidade e, entupido de amor,
decidi que aqui residiria. Assim, no dia 20 de janeiro de 2009, me
estabeleci. Enlouquecido, busquei diversas possibilidades trabalhistas.
As “coisas” não aconteciam e meu retorno ao Rio Grande do Sul se
aproximava. Um dia, fui ao Palácio da Cultura no intuito de dialogar com
algum membro da secretaria municipal de Cultura. Para minha surpresa, o
órgão, naquele momento, estava alocado no Teatro Trianon. Desconhecia o
trajeto até o local. Uma guarda municipal, solícita, me indicou o
caminho e mencionou a existência da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo
Lima. Ela me levou até a secretária do presidente, na época, Avelino
Ferreira, e consegui agendar uma conversa com o mesmo. Perdi algumas
viagens por conta dos compromissos do presidente da FCJOL. Até que, num
final de tarde, conversamos por mais de duas horas. Desde maio de 2001,
trabalho com pesquisas em História. Na época, meu currículo carregava
uma publicação, como coautor, sobre a ferrovia no município de Santa
Maria, região central do RS, intitulado “Memória Cidadã: Vila Belga”, de
2002, além de um livreto de contos, “Sobre o gostar”, de 2006; e outro
de poemas “Espasmos”, de 2008. Os dois últimos lançados de modo
independente. Apresentei diversas possibilidades a Avelino Ferreira que,
felizmente, me ofertou um trabalho no Arquivo Público Municipal de
Campos dos Goytacazes, atual Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de
Carvalho. Portanto, minha história dentro da FCJOL, em momento algum,
apresenta qualquer favorecimento político. Frisando o questionamento:
leiam os dois últimos parágrafos do livro “Campos Capital? Os interesses
econômicos e políticos distantes do povo”, lançado em maio de 2010 e
disponível na Biblioteca Municipal Nilo Peçanha e no Arquivo Público
Municipal Waldir Pinto de Carvalho, e observarão intensas contestações.
Após mais de três anos desenvolvendo pesquisas e valorizando a lida dos
poucos estagiários, lancei mais um livro em coautoria com o então
estagiário José Victor Nogueira Barreto, e me transferiram, sem poder de
escolha, ao Museu Histórico de Campos dos Goytacazes. Lá, juntamente
com Carlos Freitas e Graziela Escocard, fundei o Museu. Em parceria com
a, na época, estagiária Alba Vieira, criei o circuito expositivo “Campos
dos Goytacazes através dos tempos” que norteia as visitas guiadas. No
final de Junho de 2012, meu contrato com a empresa terceirizada foi
interrompido e, por vontade própria, me transferi ao Reda, interrompido
em agosto do mesmo ano pelo STJ. Na esperança de reversão, permaneci na
instituição até novembro. Percebendo que não receberia os salários,
simplesmente, me afastei do Museu. As conversas versavam na
recontratação dos trabalhadores após o início do segundo mandato da
atual prefeita. Não me convidaram. A explicação versou em torno de algum
comentário “deselegante” que teci contra a presidente da FCJOL,
Patricia Cordeiro. Não sei qual comentário. O que afirmo
categoricamente, é que ocupava um espaço desejado por outros
pesquisadores. Não falo do cargo no Museu; cito sobre minha atuação na
historiografia campista.
Folha – Você escreveu que todo o discurso oficial em resposta
às críticas à “debilidade das ações culturais de Campos” têm sido no
sentido de se enaltecer um governo populista. Concorda então com o
professor Arthur Soffiati, que citou o pensador francês Abraham Moles
para considerar a política cultural goitacá “populista” e “autoritária”?
Cristiano - O populismo é alienante. O autoritarismo vem atrás, disfarçado de vítima.
Folha – Em relação a esse suposto autoritarismo, você afirmou
que seu nome passou a ser “repudiado” na FCJOL, após sua saída, com
antigos companheiros de trabalho chegando a se afastar pessoalmente, por
receio de perseguição. É realmente sob esse clima que vive quem
trabalha na cultura pública do município?
Cristiano - Não generalizo. A maioria dos
trabalhadores do Museu Histórico de Campos dos Goytacazes me respeita em
âmbito pessoal e profissional. Não digo o mesmo sobre o Arquivo Público
Municipal Waldir Pinto de Carvalho. Em 2010, durante a 6ª Bienal do
Livro de Campos dos Goytacazes, ouvi comentários que menosprezaram a
grande vendagem do livro “Campos Capital? Os interesses econômicos e
políticos distantes do povo”. Este ano, em a palestra “Os Campos dos
Goytacazes na História do Brasil”, cujo público era formado por
professores da rede pública municipal de Educação, percebi que cargos
importantes evitavam conversar comigo. Sinceramente, achei e acho muito
engraçado.
Folha – Você viveu a transição dos dois governos Rosinha.
Quando, como e por que as coisas foram chegando ao nível de hoje na
cultura?
Cristiano - Valorizo muito o período presidido por
Avelino Ferreira. Creio que a sinceridade extremada seja a responsável
por sua retirada do principal cargo da FCJOL. Mesmo repleto de
contrariedades ideológicas, respeito Avelino por sua personalidade
brutal. Após a chegada da atual presidente, notei uma supervalorização
midiática e sem reflexo cultural à sociedade. Mantenho a ideia de que os
shows de artistas sem arte servem aos vendedores de cervejas que
evidenciam o alto índice da informalidade profissional ou, se
preferires, o desemprego.
Folha – A última reforma administrativa da prefeita, que
concentrou toda a administração cultural do município na FCJOL, foi
questionada dura a abertamente, além de Soffiati, por Artur Gomes,
Adriano Moura, Deneval de Azevedo Filho, Cristina Lima, José Sisneiro,
Antonio Roberto Kapi, Ricardo André Vasconcelos e, mais recentemente,
por Makhoul Moussallem. E você?
Cristiano - Na minha simplória opinião, a
concentração de poder não é benéfica aos Campos dos Goytacazes. Todavia,
seguindo o raciocínio, reflito sobre a atuação institucional anterior
ao reformismo: a Fundação Zumbi dos Palmares, por exemplo, publicou,
livros de “História” sem referências bibliográficas ou com míseras 5
bibliografias. Ou seja, a história campista é relatada sem critérios.
Folha – Ricardo André denunciou que a cultura no governo
Rosinha prioriza os shows de nomes nacionais para levar gente às ruas e
se criar na cidade um clima de comício eleitoral permanente, opinião
endossada por Makhoul e, na Câmara, pelo vereador Rafael Diniz. Pelo que
viu de dentro, o que pode dizer?
Cristiano - Costumeiramente, afirmo que o povo
brasileiro é idiotizado pelos detentores do poder. Também digo que é uma
grande mentira histórica a ideia de que o gaúcho é o povo mais
politizado do Brasil. Contudo, não recordo de gastos públicos naquele
estado com shows de custos irreais. Aqui é algo que erroneamente
tornou-se comum.
Folha – Ricardo disse ser preciso “despatricizar” a questão
cultural. Qual o limite entre a pessoa de Patricia e a política de
Rosinha na cultura local?
Cristiano - Prefiro focar na atuação dos órgãos
subordinados da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima. O Museu
Histórico de Campos dos Goytacazes serve à realização de eventos
espaçados e exposições políticas que inflam o ego da presidente. Muitos
gritos, quando há contrariedade, ameaçam. Trabalhadores de uma empresa
terceirizada lá estão e outros, antigos do Reda, foram inseridos no tal
RPA. Existem, também, DAS. Outra instituição, o Arquivo Público
Municipal Waldir Pinto de Carvalho não recebe investimentos; além da
questão paternalista que lá reside. Importantíssima instituição está em
estado vegetativo. O Museu Olavo Cardoso está fechado e a FCJOL fala em
reforma. A Biblioteca Municipal Nilo Peçanha é entupida de ótimas ideias
que não recebem investimentos. Para finalizar, o Centro de Eventos
Osório Peixoto, Cepop, entregue a Feiras de automóveis, com carnaval
feio, onde escolas de samba do Rio de Janeiro que cobram cachês
ilógicos. No final do mês de agosto, o Cepop recebeu a II Semana do
Folclore, durante 3 dias, na intenção de valorizar a cultura distante, e
assim permaneceu, da população campista.
Folha – Em relação especificamente ao abandono do Arquivo
Público, instalado no Solar dos Jesuítas, leu a matéria da Folha do
último dia 10, noticiando o depósito de garrafas pet, material altamente
inflamável?
Cristiano - A matéria mencionada expõe mais um
problema da instituição. A falta de mão de obra é clara. Porém, o mais
grave é o paternalismo engessado que privilegia currículos em detrimento
das ações culturais benéficas à sociedade.
Folha – Como um professor de história e escritor gaúcho
enxerga com os olhos de fora a cultura deste “viridente plaino goitacá”,
após tê-la vislumbrado de dentro? Como essa visão está expressa nos
seus livros sobre a história do município, “Campos Capital? Os
interesses econômicos e políticos distantes do povo”, de 2010, e “O
preconceito estampado”, de 2011, escrito em parceria com José Victor
Nogueira Barreto?
Cristiano - Nunca trabalhei na área cultural com
investimento significativo. Independente, busco alternativas. Exemplo é o
livro “Campos Capital? Os interesses econômicos e políticos distantes
do povo”. Não havia verba para publicação. Assim, minha esposa, Goreti
Maia Pluhar, criou a capa, diagramou e imprimi em uma impressora
“caseira”, dobrei as páginas e grampeei. Quase 500 exemplares foram
vendidos pela Associação Cultural do Arquivo. Já o livro “O preconceito
estampado”, lançado em 2011, novamente minha esposa criou a capa e,
surpreendentemente, contrataram uma gráfica que produziu uma tiragem de
200 exemplares. Ambas obras foram motivadas pelo desconhecimento social
do fato histórico. O primeiro livro, após vasta pesquisa nos principais
jornais campistas a partir da segunda metade do século XIX (1855,
perdurando até o final do século XX), revelou as tentativas da Cidade
dos Campos dos Goytacazes em se tornar Capital da Província do Rio de
Janeiro e, posteriormente, sede administrativa de um novo Estado: o
Estado de Paraíba do Sul. Já “O preconceito estampado” traz notícias dos
principais jornais campistas, no período entre 1930 e 1954, tempos de
Getúlio Vargas, com exceção do Governo Dutra, de 1946 a 1951, que
evidenciam o repúdio de uma sociedade conservadora com as práticas
religiosas de origem africana. O interesse pela questão surgiu logo após
minha chegada aos Campos dos Goytacazes. Pessoas com relativa
intelectualidade, afirmavam que a Cidade não se desenvolvia, ou não se
desenvolve, por conta das maldições deixadas pelos escravos africanos.
Sem pretensão, creio que meus livros tratam a História campista de forma
entendível ao cidadão campista. Além disso, fontes pouco valorizadas
pelos memorialistas e até mesmo historiadores, buscam a dificílima
verdade histórica. Outro objetivo foi e é o choque rude com o moralismo
elitista ou religioso hipócrita.
Folha – Pergunta do Soffiati agregada (aqui) à pauta geral: se você fosse convidado a organizar o setor cultural de Campos, quais seriam as suas ações?
Cristiano - Não tenho competência intelectual para
ofertar propostas nas diversas áreas culturais. Todavia, no que confere
ao meu trabalho de historiador, idealizo a criação de um Centro de
História Oral que fortalecerá a identidade local e reconhecerá o
campista como importante agente histórico. A lida, inicialmente, versará
em torno da História dos distritos e bairros dos Campos dos Goytacazes.
Outra possibilidade que observo, é a abertura real para pesquisa de
documentos abrigados no Arquivo Público Municipal Waldir Pinto de
Carvalho, além da digitalização do acervo. Uma questão que necessita
urgente reflexão versa sobre a valorização educacional da História dos
Campos dos Goytacazes.
Da edição impressa de hoje da Folha da Manhã (Folha 2, capa e página 2) e Blog Opiniões (aqui)
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