Artigo publicado na edição impressa da Folha da Manhã deste domingo, 02/07/2017- página 4:
Por Ricardo André Vasconcelos(*)
A despeito das dificuldades, o governo Rafael Diniz (PPS) sobreviveu ao primeiro semestre. Herdeiro de uma administração que faliu o município e deixou um rombo auditado em R$ 2,5 bilhões, incluindo dívida nebulosa com a Caixa Econômica Federal, o desafio será vencer os sete semestres que faltam para concluir o mandato. Até a semana passada ainda era possível administrar uma situação em que a Prefeitura tem que desembolsar, mensalmente, R$ 35 milhões além do que arrecada — em janeiro esse rombo era R$ 20 milhões maior. No entanto, chegou a hora de pagar pela gastança de Rosinha & Garotinho que, no ano passado anteciparam — e torraram — cerca de R$ 1,3 bilhão em royalties futuros.
Se estivéssemos no primeiro semestre de 2013, seria fácil. Entre janeiro e junho daquele ano, entraram nos cofres municipais, R$ 309 milhões em royalties e mais duas parcelas de Participação Especial (PE) em fevereiro e maio, respectivamente de R$ 188,7 milhões e R$ 161,4 milhões, totalizando R$ 660,5 milhões. No mesmo período deste ano, a atual administração recebeu bem menos: R$ 252 milhões, sendo R$ 170 milhões em royalties e duas parcelas de PE: R$ 35,4 milhões em fevereiro e R$ 38,3 milhões em maio.
E, como “desgraça pouca é bobagem”, agora vem a Caixa Econômica derrubar liminar concedida pela Justiça Federal que limitava o pagamento dos empréstimos da “venda do futuro” e cobrar o pagamento acima do limite de 10% do montante de royalties e PE. Com isso, o déficit mensal deve dobrar e inviabilizar a administração, inclusive no que é mais elementar, que é o pagamento dos servidores e custeio de escolas, hospitais….
Aqui é preciso abrir parênteses para lembrar que, no debate para sobre a tomada dos empréstimos — foram três — com base na arrecadação futura de royalties, o argumento era que o valor a ser despendido para o pagamento não ultrapassaria os 10% do montante a ser recebido pela PMCG. Repito isso porque até os mais submissos da submissa Câmara de Vereadores de então, se fiaram nesta informação, baseada na tal Resolução 43/2001 do Senado Federal. Se o contrato assinado entre a prefeita e a Caixa estiver em desacordo com a autorização legislativa, estaria configurado crime de responsabilidade?
Nos oito anos do consórcio Rosinha & Garotinho passaram pelos cofres da Prefeitura de Campos R$ 20 bilhões. Menos de 20 dos 5.500 municípios brasileiros tiveram tantos recursos. Famosa por sua gastança, a prefeita torrou o quanto pode em shows e obras de maquiagem, como a Beira Valão ou o elefante branco do Cepop. Duas CPI´s instaladas na Câmara de Vereadores podem desvendar outras. Objeto de uma das CPIs, os contratos com a Odebrecht para construção das “casinhas”, consumiram cerca de R$ 1 bilhão, mas o projeto batizado ironicamente de “Morar Feliz” precisa ser analisado, além do aspecto econômico, também pelo viés sociológico. São conjuntos habitacionais construídos em áreas sem escolas, postos de saúde ou equipamentos de lazer, mal servidos de transportes públicos e a qualidade das casas indica durabilidade efêmera.
Quem duvida que visite um desses conjuntos, especialmente os da margem esquerda do Paraíba. Além de tudo, a localização de vários deles favoreceu sua captura pelo crime organizado. Transferiram moradores de áreas de riscos naturais, é verdade, e os instalaram, em alguns casos, em espécies de “ilhas” que em pouco tempo foram dominadas por facções criminosas. Do nefasto legado do consórcio Rosinha & Garotinho, este vai entrar para a história como o mais trágico, não tanto pelo custo financeiro, mas pelas consequências futuras do ponto de vista social.
Se financeiramente há justificativa para complacência com o governo Rafael Diniz, politicamente a sensação é a mesma dos primeiros cem dias. Falta postura de um governo de ruptura como desejava boa parte dos 151.462 eleitores que derrotaram o jeito Garotinho de fazer política. Sim, o primeiro erro de avaliação das eminências pardas do jovem prefeito é comemorar uma vitória nas urnas sem compreender que ela foi mais fruto da rejeição ao que existia do que fé no que viria. E, ao manter no estafe figuras de proa do grupo derrotado; omitir ou não denunciar com a veemência necessária eventuais falcatruas da administração passada; optar pela cooptação dos vereadores à moda antiga (cargo x apoio) e falhar na estratégia de comunicação, o governo novo passou a imagem de “mais do mesmo” e não acumulou capital político para enfrentar os tempos das vacas magras. Venceu, mas não convenceu.
Ninguém com um mínimo de informação ignora que a crise econômica que reduziu a arrecadação, as dívidas herdadas e a monumental redução dos royalties são ingredientes de uma receita de um desastre iminente. Não há chance de socorro do Governo do Estado nem da União. Mais do que nunca Campos precisa de uma liderança política para comandar a travessia desta difícil quadra que se avizinha. Não é uma crise qualquer! É uma tragédia local dentro de Estado falido e no contexto de um país que transita rumo ao desconhecido.
A liderança natural do enfrentamento da crise cabe ao prefeito Rafael Paes Barbosa Diniz Nogueira que, ao fim do primeiro dos oito semestres do seu mandato se depara com uma grave e complexa crise financeira capaz não só de inviabilizar o município, como sua própria carreira política. Ele precisa ter capacidade de aglutinar a sociedade, especialmente os mais ricos e classe média, onde transita com mais facilidade, para ajudá-lo a encontrar saídas. Alguém vai ter que fazer sacrifícios e não serão os mais pobres. Liberais neoliberais que se contorçam, porque o receituário é clássico: menos gastos e mais impostos!
E boa sorte para todos nós.
(*) Jornalista, blogueiro e servidor federal
Publicado hoje (02) na Folha da Manhã
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