O temido coronel da política
baiana Antônio Carlos Magalhães, de tão experimentado na arte de trair e ser
traído, achava a traição tão natural que sentenciava: “o único político, no
Brasil, que não traiu seu antecessor foi Tomé de Souza, primeiro
governador-geral do Brasil”. Richelieu (1585-1642), o cardeal Frances que mais
poder teve na Europa absolutista, foi mais sintético: “traição é apenas uma
questão de data”. Todos traem, resta saber quando.
Essa introdução meio metido à
besta foi só para tentar dar um certo verniz à arenga paroquial envolvendo o
nosso candidato a ACM e um pupilo rebelde: Garotinho e Arnaldo Vianna. Eles disputam pela mídia quem teria dado o primeiro
passo para uma eventual reaproximação política. Um atribui ao outro a iniciativa,
que ambos desmentem e até dizem desconhecer o cabo eleitoral que estaria tentando servir de cupido.
Ao jornalista Aluysio Abreu, do Blog
Opiniões (
aqui), Arnaldo nega a iniciativa, mas aceitaria reatar com
o ex-padrinho político (de quem foi secretário de Saúde e vice-prefeito), desde
que Garotinho pedisse desculpas a ele e a sua mãe, e que esta diga que aceitou. Infeliz
declaração. Dona Amélia França Viana, respeitada professora antes mesmo de o
filho doutor fazer vida na política, faleceu há alguns anos sem ver apurada a
denúncia que Garotinho fazia (e ainda faz) de que Arnaldo teria depositado, em
nome da mãe, alguns milhões de dólares numa conta em paraíso fiscal sem a
devida declaração às autoridades fazendárias.
Ontem Garotinho usou a rádio
Diario FM para negar que tenha dado qualquer passo para se reaproximar de
Arnaldo (estão rompidos desde 2002), e reiterou a denúncia de que o
ex-prefeito, que o substituiu em 1997 e que ajudou a reeleger em 2000, está
sendo investigado por ter algo em torno de R$ 50 milhões de dólares no exterior.
Disse também que da “quadrilha” fazem
parte ainda outras pessoas, como o também ex-prefeito Alexandre Mocaiber.
Eis aí a traição às avessas. Da
mesma forma como é capaz de romper com todos os aliados que ajuda a eleger (a
única exceção ainda é Rosinha), Garotinho transforma ex-rivais em amigos de
infância, como fez com Paulo Feijó, entre outros e agora, surpreendentemente
com Mocaiber. Sim, exatamente ele. Em público, como fez na rádio ontem,
Garotinho continua evocando o avião preto da Polícia Federal como símbolo da
corrupção no governo Mocaiber, mas em particular, enche a boca para contar que
ele, Garotinho, está ajudando a custear
as despesas advocatícias para evitar a prisão de Mocaiber. A história, com
riqueza de detalhes, incluindo reverentes agradecimentos familiares, foi
contada para platéias diferentes.
Traído pelos “postes” que elegeu
e traidor dos partidos que o abrigou, Garotinho trai de novo quando atua ao
mesmo tempo como defensor da moralidade denunciando gente como Mocaiber
ao mesmo tempo em que provê, por baixo dos panos, meios para que o mesmo Mocaiber
postergue seu acerto de contas pelos crimes que, segundo Garotinho
exaustivamente denunciou, teria cometido.
Se não for mais uma bazófia é
mais um boi voando nos céus da Planície incrédula.