quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

REDA FRUSTRA A REGRA DO CONCURSO PÚBLICO



A decisão é de 18/12/2012, mas foi publicada hoje no Diário Oficial de Justiça. Na decisão, o ministro Joaquim Barbosa, presidente do SRF, nega seguimento ao pedido da Prefeitura de Campos para suspender a liminar concedida pela 4ª Vara Cível de Campos que mandou suspender a contratação de trabalhadores temporários. É bom ler os argumentos do ministro que alerta que a regra é concurso público. Recortei esse trecho:
 "A magnitude dos editais (com dezenas de cargos diversos), a quantidade (mais de mil cargos), e a forma de contratação (todos por currículo e entrevista), publicados em curtíssimo período de tempo, e logo após amplo concurso realizado, configuram verdadeira violação aos [sic] princípios constitucionais, colocando em risco à [sic] continuidade dos serviços públicos, perpetuando a temporariedade e frustrando a regra do concurso público”.

A íntegra (aqui):



SL/658 - MEDIDA CAUTELAR NA SUSPENSÃO DE LIMINAR

Classe:SL
Procedência:DISTRITO FEDERAL
Relator:MINISTRO PRESIDENTE
PartesREQTE.(S) - MUNICÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES
ADV.(A/S) - PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES
REQDO.(A/S) - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - JOSÉ PAES NETO
ADV.(A/S) - JOSÉ PAES NETO
INTDO.(A/S) - FUNDAÇÃO CULTURAL JORNALISTA OSWALDO LIMA
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE ESPORTES DE CAMPOS DOS GOYTACAZES
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - JOILZA RANGEL ABREU
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - IZAURA COLODETE ANTÔNIO DE SÁ FREIRE
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - MAGNO PRISCO PEREIRA NEVES
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - PATRÍCIA CORDEIRO ALVES
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - MARCELO NEVES BARRETO
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) - ANA LUCIA SANGUÊDO BOYNARD MENDONÇA
ADV.(A/S) - SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
Matéria:DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO | Concurso Público / Edital 
DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO | Contratos Administrativos | Suspensão 



Decisão: Trata-se de pedido de suspensão de liminar, acompanhado por pleito de medida cautelar, apresentado pelo Município de Campos dos Goytacazes/RJ contra decisão proferida pela Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes nos autos da Ação 0036725-24.2012.8.19.0014 (AI 0050773-30.2012.8.19.0000).
Narra o município-requerente que o Juízo da 4ª Vara Cível deferiu medida liminar pleiteada em Ação Popular para suspender os contratos firmados entre o ente público e trabalhadores temporários, interromper o pagamento aos trabalhadores temporários já contratados e abster-se de realizar novas contratações de mão-de-obra temporária.
Segundo argumenta o requerente, a decisão concessória da medida liminar:
 
a) Viola serviços e programas públicos essenciais, por forçar a descontinuidade das respectivas prestações (art. 6º da Constituição);
b) Causa dano ao erário, ao impedir o requerente de utilizar recursos públicos provenientes da União;
c) Afasta norma local plenamente constitucional que permite a adoção de processo seletivo simplificado para a contratação de servidores públicos.
 
Ante o exposto, pede-se a suspensão da medida liminar concedida pelo Juízo da 4ª Vara Cível de Campos dos Goytacazes nos autos da Ação 0036725-24.2012.8.19.0014, até que eventual sentença de mérito condenatória transite em julgado.
É o relatório.
 
Decido.
Estão ausentes os requisitos que ensejariam a concessão da medida pleiteada.
A suspensão de liminar é medida profundamente invasiva, cabível somente em situações-limite em que posto em risco de ruína a continuidade da ordem social.
De fato, a suspensão de liminar não se presta à concessão de efeito análogo à cautela ordinária, nem à substituição de medida ou de recurso destinado a impugnar ou a desconstituir decisão judicial.
No caso em exame, a alegação de risco de descontinuidade da ordem social é genérica e sem amparo probatório mínimo.
Em relação aos serviços de educação, o requerente sustenta seu pedido com as seguintes palavras:
 
 
A contratação temporária deflagrada pela referida Secretaria fez-se necessária em razão de haver nos presentes dias, 394 professores em licença médica, carência que não gera abertura de vaga real para chamamento de profissionais efetivos e permanentes.
Além disso, há outros 200 profissionais readaptados, sendo certo que a execução da liminar implica na ausência de profissionais em salas de aula, gerando premente desordem social. Noutras palavras, a imediata mantença da decisão em epígrafe traduz se em não prestação do direito social à educação, ficando MAIS DE 7000 crianças sem as respectivas aulas, gerando inevitável desordem social ao Município requerente. (Doc. 02)
 
Os afastamentos e as readaptações por razões de saúde são eventos passíveis de quantificação estatística e atuarial. Faz parte do planejamento responsável a previsão de certo grau de ausências temporárias e dos respectivos meios de suprimento (salvaguardas secundárias, terciárias, redundantes etc). Esse backup deve ser suprido pelo quadro efetivo do ente público, na medida em que, conforme dito, as ausências temporárias decorrentes de afastamentos ou readaptações por razões de saúde são eventos previsíveis ainda que por aproximação estatística. A falha gerencial no dimensionamento da demanda certamente não é situação excepcional a justificar a contratação temporária de trabalhadores sem vínculo efetivo com a administração.
Por outro lado, o requerente nada disse, nem provou, sobre a excepcionalidade do grande número de afastamentos. Sem a argumentação e a imprescindível comprovação de que a carência de cerca de 594 profissionais foi causada por evento imprevisível e extraordinário (um epidemia, por exemplo), fica reforçada a situação de normalidade que deveria ter sido enfrentada por atos de gestão regulares, sem apelo às regras aplicáveis apenas em situações estreitas, muito bem definidas de excepcionalidade.
Em relação ao PROJOVEM, a inicial não detalha tal programa, sua finalidade nem meios. Portanto, é impossível confirmar a afirmativa feita pela requerente que se trata de programa esporádico. A mera circunstância de o programa “depender” de recursos da União não o torna temporário, pois, se ele versar sobre atividade pública primária, sua execução pelo Município será obrigatória.
Quanto aos “trabalhos realizados pela Secretaria Municipal de Família e Assistência Social – Direito à moradia e assistência aos desamparados”, a atividade de “análise e inclusão das famílias que preenchem os requisitos delineados em lei” é intrínseca ao Estado. Não é possível dissociá-la da finalidade principal, pois ela é instrumental à política habitacional local.
Sobre a Fundação Municipal Cultural Jornalista Oswaldo Lima, Museu Histórico e Centro de Eventos Populares, a inicial não contém quaisquer dados que caracterizem as atividades desempenhadas pelo pessoal temporário, de modo a impedir qualquer conclusão sobre o risco de ruína social alegadamente criado pelo Juízo da 4ª Vara Cível.
Por fim, pertinente aos serviços de saúde, o próprio requerente afirma que foram afastados coordenadores de programas de combate à tuberculose, às DST, ao HIV, à Síndrome de Alzheimer, bem como do Centro de Referência do Trabalhador. Ora, nenhuma dessas atividades médicas ou profiláticas pode ser considerada passageira, pois todas são ordinárias, comuns à atuação estatal no campo dos serviços de saúde.
Tal como exposto anteriormente, apenas se comprovado evento singular, como uma epidemia, seria cabível reconhecer a excepcionalidade da situação apta a justificar a contratação temporária.
Também é relevante ressaltar que o Juízo da 4ª Vara Cível apontou razões específicas para reconhecer a falta de excepcionalidade do quadro.
A propósito, confiram-se os seguintes trechos:
 
“Não obstante, a amplitude e a natureza das funções estipuladas denotam que os cargos oferecidos, com exceção do referido na alínea ´h´, não se encontra na excepcionalidade prevista na Carta Magna, revelando atividades permanentes que deveriam ser desempenhadas por servidor público. Há cargos de professor Substituto (20 cargos), mediador - 50 cargos (fls. 37), interprete de libras - 20 cargos (fls. 39), orientador de biblioteca braile (fls. 40), cuidador - oito cargos (fls. 42), preparador físico (fls. 44), dentre tantos ouros previstos nos editais.
A magnitude dos editais (com dezenas de cargos diversos), a quantidade (mais de mil cargos), e a forma de contratação (todos por currículo e entrevista), publicados em curtíssimo período de tempo, e logo após amplo concurso realizado, configuram verdadeira violação aos [sic] princípios constitucionais, colocando em risco à [sic] continuidade dos serviços públicos, perpetuando a temporariedade e frustrando a regra do concurso público (Doc. 04).
 
Também está presente o risco reverso. O prolongamento de contratações que o Judiciário, ao menos em caráter liminar, considerou inválidas, cria dois tipos de expectativa inadequadas. Para os ocupantes dos cargos, há a instabilidade jurídica de sua condição, que poderá ser alterada a qualquer momento e sem a proteção trabalhista ordinária. Quanto ao ente público, a permanência de regimes de contratação aparentemente inválidos reforça tolerância e dependência perniciosas às regras da legalidade e da eficiência administrativa.
Ante o exposto, nego seguimento à suspensão de liminar (art. 38 da Lei 8.038/1990).
Fica prejudicado o exame da medida liminar pleiteada.
Publique-se. Int..
 
Brasília, 18 de dezembro de 2012.
 
Ministro Joaquim Barbosa
Presidente
Documento assinado digitalmente

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