domingo, 23 de novembro de 2014

"CHEQUE EM BRANCO E, TALVEZ, SEM FUNDOS", PUBLICADO NA FOLHA DA MANHÃ

Do Blog Opiniões (aqui) e da edição impressa da Folha da Manhã de hoje:

Artigo do domingo — Cheque em branco e, talvez, sem fundos

cheque em branco


Ricardo André
Jornalista Ricardo André Vasconcelos
Por Ricardo André Vasconcelos
Que o grupo político dominante na cidade despreza qualquer forma de diálogo com a sociedade, não há dúvidas. A novidade é que estão esticando os limites como se depositassem na omissão das instituições a garantia da impunidade, independente de quais e quantos desmandos patrocinem.
A mais recente afronta é o velho expediente de antecipar arrecadação de anos futuros e deixar a conta para as próximas administrações. Na semana passada, a Câmara Municipal, com a notória maioria subserviente, aprovou uma lei que permite à prefeita Rosinha Garotinho, na prática, antecipar recebimento dos royalties. O texto da lei (6.598, de 18/11/2014, publicada na página 1 do D.O. de 19/11/2014), é um monumento à desfaçatez. Usa e abusa de eufemismos para esconder o propósito de tomar empréstimo bancário dando como garantia de pagamento a receita futura dos royalties do petróleo (incluindo Participação Especial) até 31 de dezembro de 2016. O Poder Legislativo Municipal autorizou a prefeita Rosinha a “ceder a instituições financeiras públicas créditos decorrentes de royalties…”.Traduzindo: por “instituições financeiras públicas” entenda-se Banco do Brasil e Caixa Econômica, e “ceder” neste texto é um verbo injustificável, porque ao antecipar a receita junto a uma instituição financeira, que não vive de benemerência, os valores deverão ser pagos com juros de mercado. É empréstimo, não cessão!
A lei também é imperdoavelmente omissa quanto ao limite de valores, tornando-se um cheque em branco para a prefeita gastar como quiser, empenhando todas as receitas do petróleo até seu último dia de mandato e deixando a conta, repito, para os sucessores…
E mais: além de branco, o cheque pode não ter fundos!!!!!
Sim, mesmo com a previsão que em 2015 a Prefeitura de Campos receba valores semelhantes aos anos de 2013 e 2014 (cerca de R$ 1,3 bilhão), não podemos esquecer que ainda tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, a ADI 4197, que tenta anular a lei 12.734/2012. Para os que se esqueceram, foi a lei aprovada no Congresso Nacional que estendeu a distribuição dos royalties do petróleo para todo o país e, se vigorar, reduz em 60% os repasses para o município de Campos. A distribuição só continua mantida pela lei anterior por força de uma liminar da ministra Carmen Lúcia, que em 18/03/2013, suspendeu os efeitos da nova lei até que o assunto seja decidido pelo Plenário da Corte.
A própria prefeita Rosinha Garotinho fez várias incursões ao STF para acompanhar a tramitação da ADI,  preocupada com a possibilidade da drástica redução de repasses, mas agora ganhou da Câmara Municipal o direito de dispor antecipadamente de uma receita ainda incerta, como se vendesse os ovos antes da galinha trazê-los aos mundo. Aos demais Estados interessa que a lei seja declarada constitucional porque beneficia todos, com exceção do Rio de Janeiro, Espírito Santo e, de maneira bem menos impactante, São Paulo. Tanto que, assim como a Organização dos Municípios produtores de Petróleo (Ompetro), que a prefeita de Campos preside, praticamente todos os Estados são parte da Ação Direta de Inconstitucionalidade na condição de “amicus curae”, todos trabalhando incessantemente para que os royalties sejam distribuídos por todos os municípios brasileiros e não entre os localizados nos Estados produtores.
Portanto, é um assunto que precisa ser explicado e debatido com a sociedade com franqueza, sem eufemismos e argumentos falaciosos, porque a forma como está sendo conduzida a questão, além de demonstrar desprezo pela opinião pública, abre margem para as mais diversas interpretações. A mais corrente? Há um rombo nas contas municipais! Seus motivos mais “nobres”? Má gestão, falta de planejamento e gastança irresponsável!

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