Da revista Istoé, atualizada hoje, domingo, 05/01/2014 (AQUI):
N° Edição: 2302 | 27.Dez.13 - 19:00 | Atualizado em 05.Jan.14 - 21:42
Tropa da elite
Renan Calheiros, presidente do Senado, e Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara, enviam seguranças do Congresso para missões secretas longe de Brasília. O problema é que a ação é ilegal
Josie JeronimoEM SERVIÇO
Policiais no Congresso: eles são servidores com atribuições de guarda e proteção de
parlamentares e do patrimônio do Legislativo, mas não podem apurar infrações fora de Brasília
Em pleno feriado natalino, o presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), foi a público justificar o uso de
jatinho da FAB para ir a Pernambuco fazer um implante capilar. Na virada
do Réveillon, o senador será obrigado a dar novas explicações. Desta
vez, sobre os motivos que o levaram a enviar seguranças do Senado para
missões sigilosas em sua terra natal. ISTOÉ identificou ao menos três
dessas viagens, feitas em fevereiro, outubro e novembro, que incluíram
diligências ilegais, monitoramento de pessoas e tomada de depoimentos
numa delegacia de polícia. Ao menos três servidores foram usados na
empreitada: Everaldo Bosco, Gabriel Reis e Floriano Pinheiro. Com o aval
do senador alagoano, os policiais não se intimidaram ao bancar “os
xerifes” de Renan, violando competências que são exclusivas da Polícia
Federal e da Civil.
A chamada “polícia legislativa” não passa de um corpo de servidores do Congresso com atribuições de guarda e proteção dos parlamentares e daquilo que pode ser classificado como patrimônio do Legislativo, como veículos, edifícios, móveis e equipamentos. Esses policiais podem até fazer apuração de infrações penais, desde que tenham ocorrido dentro de seus domínios. A Procuradoria da República, inclusive, já emitiu parecer que veda o uso dessa turma fora das Casas.
Renan, porém, parece fazer vista grossa para o que diz a lei. Mais grave ainda: com suas ações, sugere ocupar um espaço privilegiado acima dela. Protegidos pelo manto do sigilo dessas operações, os servidores do Senado se abstêm de dar explicações, o que dá margem para especular se o trabalho externo seria apenas um exagero administrativo ou uma vexatória ação política contra rivais eleitorais em Alagoas. O presidente do Senado quer eleger Renan Calheiros Filho, o Renanzinho, governador do Estado em 2014.
A chamada “polícia legislativa” não passa de um corpo de servidores do Congresso com atribuições de guarda e proteção dos parlamentares e daquilo que pode ser classificado como patrimônio do Legislativo, como veículos, edifícios, móveis e equipamentos. Esses policiais podem até fazer apuração de infrações penais, desde que tenham ocorrido dentro de seus domínios. A Procuradoria da República, inclusive, já emitiu parecer que veda o uso dessa turma fora das Casas.
Renan, porém, parece fazer vista grossa para o que diz a lei. Mais grave ainda: com suas ações, sugere ocupar um espaço privilegiado acima dela. Protegidos pelo manto do sigilo dessas operações, os servidores do Senado se abstêm de dar explicações, o que dá margem para especular se o trabalho externo seria apenas um exagero administrativo ou uma vexatória ação política contra rivais eleitorais em Alagoas. O presidente do Senado quer eleger Renan Calheiros Filho, o Renanzinho, governador do Estado em 2014.
Até agora, apenas uma das viagens foi
parcialmente justificada sob o argumento de que senadores alagoanos –
existem apenas três – estavam sendo vítimas de tentativa de extorsão por
meio de telefonemas anônimos. Dessa maneira, os policiais do Senado
foram enviados para tentar desbaratar o suposto esquema. O Senado,
porém, não abriu à reportagem os autos da investigação. A assessoria de
imprensa da Casa garante que a missão teve como objetivo investigar a
extorsão e informou que um dos depoentes confessou ter obtido R$ 20 mil
com o golpe. Mas não disse qual parlamentar pagou.
Seja como for, o deslocamento dos três agentes custou aos cofres públicos R$ 30 mil, considerando as passagens, diárias e o aluguel de automóvel. Sem distintivo de verdade, sem viatura oficial e sem a autoridade legal, os servidores tiveram que levar os suspeitos para uma delegacia da Polícia Civil, onde tomaram os depoimentos. Não houve autorização judicial para essas ações. Logo, as investidas determinadas por Renan foram ilegais. Depois dessa primeira viagem, o trio de agentes voltou a Alagoas outras duas vezes, mas o Senado mantém os motivos dessas missões em segredo. Pelo que se sabe, foram as únicas investigações da polícia do Senado fora de Brasília.
Seja como for, o deslocamento dos três agentes custou aos cofres públicos R$ 30 mil, considerando as passagens, diárias e o aluguel de automóvel. Sem distintivo de verdade, sem viatura oficial e sem a autoridade legal, os servidores tiveram que levar os suspeitos para uma delegacia da Polícia Civil, onde tomaram os depoimentos. Não houve autorização judicial para essas ações. Logo, as investidas determinadas por Renan foram ilegais. Depois dessa primeira viagem, o trio de agentes voltou a Alagoas outras duas vezes, mas o Senado mantém os motivos dessas missões em segredo. Pelo que se sabe, foram as únicas investigações da polícia do Senado fora de Brasília.
OLHO NA ELEIÇÃO
Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves: missões
policiais inexplicadas em seus redutos eleitorais
No lado verde do tapete do Congresso, a
polícia da Câmara também se investe de falsa autoridade policial para
sair pelo País em missões secretas. Em abril passado, o presidente da
Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), autorizou dois servidores da
Casa, Edilson Brandão e Thiago Elízio, a ficarem dez dias no Tocantins
“colhendo provas” para um processo administrativo. Com R$ 7 mil em
diárias, passagens e aluguel de carro pago pela Câmara, os servidores
percorreram os municípios de Formoso do Araguaia e Gurupi dando
carteiradas, realizando interrogatórios e reunindo informações. Para
explicar as diligências de sua polícia, a assessoria de imprensa da
Câmara alega que o trabalho externo faz parte de uma investigação de
fraude previdenciária. ISTOÉ solicitou detalhes da investigação, mas a
Câmara se negou a fornecer. Coincidência ou não, em outubro passado o
deputado federal Osvaldo Reis, do PMDB de Tocantins, subiu à tribuna
para denunciar fraude no Instituto de Gestão Previdenciária do Estado
(Igeprev). Na ocasião, Reis entregou um dossiê do caso ao ministro da
Previdência, Garibaldi Alves. Desde então, o episódio se tornou um
cabo-de-guerra entre oposição e governo tocantinense.
Além dessas investigações não oficiais, as polícias legislativas também têm sido usadas para fazer a escolta de parlamentares. O deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) só anda em Brasília acompanhado por uma equipe de segurança da Câmara. No Rio de Janeiro, ele usa seguranças privados. Outro a usufruir do privilégio é o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), que tem à disposição três policiais legislativos para acompanhá-lo fora de Brasília. Além das passagens aéreas, a “segurança público-privada” de Mozarildo custou, em 2013, R$ 48 mil só em diárias. Dezesseis servidores se revezam na missão de acompanhar os passos do senador, que alega ser alvo do governador de Roraima, o tucano José de Anchieta Júnior.
O efetivo da polícia da Câmara é hoje de 220 servidores, um pouco menor do que o do Senado, com 260 agentes. Um projeto de resolução da Mesa Diretora pretende ampliar o número de agentes e criar a figura do “delegado”. O problema é que a medida prevê a existência de 20 delegados para apenas uma delegacia, a unidade da polícia legislativa do anexo I da Câmara. O projeto prevê, ainda, contratação de outros 80 policiais. A remuneração desses agentes legislativos está entre as maiores do País, variando de R$ 13 mil até R$ 20 mil. Fora das dependências do Congresso, as polícias legislativas não têm nenhum amparo legal para investigar ou repreender ninguém. Seu trabalho equivale ao serviço prestado por uma empresa privada de segurança – ou seja, são forças paralelas ao aparato de proteção do Estado.
Além dessas investigações não oficiais, as polícias legislativas também têm sido usadas para fazer a escolta de parlamentares. O deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) só anda em Brasília acompanhado por uma equipe de segurança da Câmara. No Rio de Janeiro, ele usa seguranças privados. Outro a usufruir do privilégio é o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), que tem à disposição três policiais legislativos para acompanhá-lo fora de Brasília. Além das passagens aéreas, a “segurança público-privada” de Mozarildo custou, em 2013, R$ 48 mil só em diárias. Dezesseis servidores se revezam na missão de acompanhar os passos do senador, que alega ser alvo do governador de Roraima, o tucano José de Anchieta Júnior.
O efetivo da polícia da Câmara é hoje de 220 servidores, um pouco menor do que o do Senado, com 260 agentes. Um projeto de resolução da Mesa Diretora pretende ampliar o número de agentes e criar a figura do “delegado”. O problema é que a medida prevê a existência de 20 delegados para apenas uma delegacia, a unidade da polícia legislativa do anexo I da Câmara. O projeto prevê, ainda, contratação de outros 80 policiais. A remuneração desses agentes legislativos está entre as maiores do País, variando de R$ 13 mil até R$ 20 mil. Fora das dependências do Congresso, as polícias legislativas não têm nenhum amparo legal para investigar ou repreender ninguém. Seu trabalho equivale ao serviço prestado por uma empresa privada de segurança – ou seja, são forças paralelas ao aparato de proteção do Estado.
No início de 2014, está prevista para
entrar na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação declaratória
de constitucionalidade que vai limitar as atribuições administrativas da
polícia e transformar em crime as ações informais de investigação e
repressão realizadas por essas equipes de segurança do Congresso. Na
ação, relatada pela ministra Cármen Lúcia, a PGR argumenta que
investigações criminais sempre atingem direitos fundamentais dos
cidadãos. Por isso, apenas órgãos públicos que estejam formalmente
submetidos à fiscalização do Ministério Público podem conduzir
inquéritos. “À Polícia Federal é reservada, com exclusividade, a função
de polícia judiciária da União”, diz a PGR. Pelas atitudes de Renan e
seus colegas, e considerando o início de um ano eleitoral que promete
muitos embates, a regulamentação das atividades da Polícia Legislativa é
não só urgente como imprescindível para a garantia do equilíbrio
democrático.
fotos: Adriano Machado/AG. ISTOÉ; Alan Marques/Folhapress
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